A tão aguardada reprodução simulada da morte do adolescente Gabriel Lincoln Pereira da Silva, de 16 anos, realizada na noite desta terça-feira (15), em Palmeira dos Índios, foi marcada por fortes emoções e, sobretudo, por versões contraditórias entre as testemunhas que participaram do procedimento. O jovem foi baleado durante uma ação da Polícia Militar no dia 3 de maio deste ano.
O procedimento, que durou mais de seis horas, foi conduzido pelo Instituto de Criminalística de Alagoas, com apoio da Polícia Científica, e teve como objetivo esclarecer a dinâmica dos fatos. A reconstituição ocorreu no mesmo local da abordagem policial e contou com a presença de peritos, representantes do Ministério Público, policiais civis, advogados das partes, familiares de Gabriel e dos cinco policiais militares das duas guarnições envolvidas na ação que resultou na morte do menor.
Duas viaturas da Polícia Militar foram utilizadas na reprodução. Devido às versões divergentes apresentadas pelas testemunhas, os veículos chegaram a ser reposicionados durante o procedimento, conforme cada relato, a fim de simular com exatidão as possíveis dinâmicas da cena do crime. Uma motocicleta deitada no chão também foi utilizada na simulação, representando o veículo que estaria sendo conduzido por Gabriel no momento da abordagem.
Segundo o delegado Sidney Tenório, que comanda a comissão especial da Polícia Civil responsável pela investigação, a reprodução foi solicitada diante das fortes contradições entre os relatos de testemunhas e policiais. Ele ressaltou a importância da diligência para esclarecer os fatos.
“As oitivas, que para nós são fundamentais, tiveram alguns pontos divergentes por parte das testemunhas. É por isso que pedimos a reprodução simulada. Não é todo caso que exige esse tipo de diligência, mas, quando percebemos um contraditório muito significativo entre os depoimentos das testemunhas, é necessário esclarecer. A população de Palmeira dos Índios espera por respostas, e essa é uma forma de dar clareza ao processo”, explicou o delegado.
O resultado da reprodução simulada deverá ser concluído em um prazo estimado entre 10 e 30 dias, quando o laudo será finalizado e entregue ao Ministério Público.
Segurança e isolamento da área
Para garantir o sigilo e a integridade dos envolvidos, parte da Avenida Vieira de Brito foi isolada pela Superintendência Municipal de Transportes e Trânsito (SMTT), com o apoio da Guarda Municipal e da Polícia Militar. O tráfego foi bloqueado e o acesso ao público, controlado. Apesar das restrições, moradores da região acompanharam com atenção o desenrolar da ação pericial.
Conflito de versões
Apesar da simulação, prevaleceram relatos divergentes. Testemunhas apresentaram versões que contradizem informações anteriores fornecidas pelos policiais, especialmente quanto à posição dos envolvidos no momento do disparo e ao comportamento de Gabriel antes de ser atingido. Para dar maior fidelidade à dinâmica dos acontecimentos, atores foram usados na reconstituição, representando as diferentes narrativas e contribuindo para evidenciar as contradições entre elas.
Laudos
O exame de balística confirmou que o revólver calibre .38, atribuído a Gabriel, estava em condições de uso e continha um projétil compatível. No entanto, o revólver não possui registro no Sistema Nacional de Armas (SINARM), o que levanta dúvidas sobre sua procedência. Outro fator em análise é a presença de material genético não identificado na arma. O Instituto Médico Legal (IML) colheu amostras de DNA dos pais da vítima para verificar possível correspondência com o resíduo, que pode ser sangue, pele ou outro tecido biológico.
Família contesta versão da PM
Os militares envolvidos na ação que resultou na morte do menor sustentam que o adolescente desobedeceu à ordem de parada enquanto pilotava uma moto, fugiu da abordagem e teria efetuado um disparo contra a guarnição. Os agentes afirmam ter revidado à agressão. A família, no entanto, rebate essa versão com veemência, afirmando que Gabriel estava desarmado e foi executado sumariamente, sem chance de defesa.
Cícero Pereira, pai de Gabriel, comentou o momento com emoção e reafirmou o compromisso da família com a luta por justiça: "Bateu a emoção, a saudade, a dor... Ver essa cena reconstituída mexeu demais com a gente. É como reviver tudo outra vez. Mas seguimos firmes, seguimos em busca de justiça. Não vamos descansar enquanto a verdade não vier à tona e os responsáveis não forem punidos."
Desde a morte do adolescente, o caso tem gerado comoção em Palmeira dos Índios e mobilizado entidades de direitos humanos. Protestos e manifestações vêm sendo realizados nas redes sociais com pedidos por justiça, transparência e responsabilização.
Fase final da investigação
Com a reconstituição concluída e os principais elementos já reunidos, o inquérito entra agora em sua etapa final. A comissão de delegados da Polícia Civil deverá encaminhar o relatório conclusivo ao Ministério Público Estadual, que decidirá se oferece denúncia criminal contra os policiais envolvidos.
Enquanto isso, a cidade segue mobilizada e atenta ao desfecho do caso. A morte de Gabriel Lincoln se tornou um símbolo da luta por justiça — e a sociedade cobra que essa história não termine em impunidade.
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